Resumo

O aprendizado e a realização de tarefas motoras de habilidade podem induzir mudanças comportamentais e neurofisiológicas, o que ocorre tanto em animais intactos quanto naqueles submetidos às lesões do SNC. Nesse sentido, alguns trabalhos evidenciam uma possível participação dos astrócitos GFAP+ na plasticidade induzida por experiências comportamentais. Objetivo: Avaliar o desempenho sensório-motor e aspectos morfológicos de astrócitos GFAP+ no córtex sensório-motor (área de representação do membro anterior) e no estriado dorsolateral, em ratos submetidos à hemorragia intracerebral experimental (HIC) e aos treinamentos de habilidade do alcance (TH) ou ao treinamento de não-habilidade (TNH). Método: Ratos Wistar adultos (n=60) foram inicialmente adaptados às diferentes tarefas motoras empregadas ao longo de 3 semanas. Após, os mesmos foram submetidos à cirurgia de HIC por meio da administração intra-estriatal de colagenase tipo IV, ou a falsa cirurgia (sham). Decorridos 7 dias, os animais dos grupos S-TH (n=8) e HIC-TH (n=12) foram submetidos ao treinamento da TH, os animais dos grupos S-TNH (n=8) e HIC-TNH (n=12) foram submetidos ao treinamento da TNH e os animais S-ST (n=8) e HIC-ST (n-12) não receberam nenhum tipo de treinamento durante 4 semanas. Ao longo desse período, os animais foram testados quanto ao desempenho sensório-motor utilizando-se os testes do Staircase, escada horizontal e cilindro. Encerrado o período de treinamento, os animais foram profundamente anestesiados, perfundidos e tiveram seus encéfalos processados para a análise morfológica, realizada pela avaliação do volume da lesão e dos astrócitos GFAP+ (imagens obtidas em microscópio confocal - eixo-z). A ramificação dos processos primários foi avaliada por meio do método dos círculos concêntricos de Sholl. Todos os procedimentos foram aprovados pelo comitê de ética em pesquisa da UFRGS. Resultados: Os resultados demonstram que a referida tarefa de habilidade, mas não o treinamento de não-habilidade, foi capaz de promover uma melhor recuperação sensório-motora pós-HIC, o que foi evidenciado nos testes comportamentais do Staircase [2ª (P<0,03), 3ª (P<0,01) e 4ª semanas (P<0,001)], escada horizontal [3ª e 4ª semanas (P<0,03)] e cilindro [4ª semana (P<0,03)]. Além disso, a realização da tarefa de habilidade do alcance e preensão foi capaz de aumentar o comprimento médio dos processos primários (µm) em astrócitos GFAP+ tanto no córtex sensório-motor ipsilateral [Sham+TH (14,27±0,90; P<0,03); HIC+TH (17,45±0,23; P<0,05)] quanto contralateral à injeção estereotáxica [Sham+TH (16,38±0,96; P<0,03); HIC+TH (16,38±0,96; P<0,03)]. Esse fato também foi observado no estriado dorsolateral (ipsilateral à referida injeção) [Sham+TH (12,88±0,33; P<0,03); HIC+TH (13,83±0,76; P<0,05)]. Quanto à densidade astrocitária (astrócitos/µm3), ocorreu um aumento da mesma nos animais submetidos à HIC em todas as regiões avaliadas (P<0,01), o que não foi influenciado pelas tarefas motoras. Da mesma forma, o número dos processos primários apresentou-se aumentado somente no córtex ipsilateral à HIC (P<0,05). Em relação ao volume da lesão não foram evidenciados efeitos relacionados às tarefas motoras empregadas. Conclusão: Nossos resultados sugerem que modificações morfológicas em astrócitos GFAP+ fazem parte dos mecanismos neurobiológicos que medeiam a plasticidade induzida pela tarefa de habilidade, além de possivelmente contribuírem para a recuperação sensório-motora.